Ansiosas
pelo espetáculos dos fogos nos grandes centros, expectantes pelas guloseimas na
reunião de família ou se fazendo promessas remissivas – em todo caso, as
pessoas demonstram assaz expectantes quando se trata dos momentos finais de um
ano. A própria surpresa pelo fato de o ano estar nos deixando leva a
comentários do tipo “como o tempo passou” ou “parece que foi ontem que começávamos
esse ano”. Em tudo, testemunhamos ritos de passagem. De certa maneira, eles
surgiram como memória simbólica. A questão é que os símbolos estão nus na era
do consumo. É o mundo líquido, no dizer de Bauman, erodindo os memoriais do
ocidente – água mole em pedra dura…
O que quer tudo isso? Que a vida perdeu
significado em uma sociedade marcadamente relativista e de moral utilitária. Logo,
a ansiedade do fim de ano, que em algum tempo levava à reavaliação da conduta e
à formulação de propósitos específicos dali por diante (algo que se degenerou
para as fúteis promessas de fim de ano), parece cair em ouvidos moucos. Até bate
uma ansiedade, porém a reflexão que ela naturalmente despertaria é sufocada por
apelos de consumo e espetáculos que celebram o ano na forma de acontecimentos
únicos elegidos pela mídia. E o ano de todos se reduz a alguns eventos
marcantes, sem que se pare sequer para agradecer as pequenas realizações que
Deus proporcionou no campo pessoal ou na vida da comunidade. A ação glocal das
retrospectivas com ênfase no mundo das celebridades, esportes ou eventos anula
a percepção de Deus interagindo na vida de Seus filhos.
E
passada a ocasião do fim de ano, já surgem as primeiras festas saudando
hedonisticamente o novo ano, quando menos ainda se reflete sobre o papel no
mundo e os deveres e reponsabilidades cristãos. Somos arrastados em uma
enxurrada de sentimentos eufóricos celebrando o milagre da vida, uma expressão
que foi tão secularizada, que não se pode deixar de notar a ironia de haver
milagre sem a figura de quem os orquestra.
Assim
o ano segue, marcados por feriados e datas especiais, cada vez mais servindo
como interrupção despropositada do trabalho. Não no sentido de que o descanso
seja de todo inútil; apenas que o motivo inicial para a existência daquela data
específica perdeu-se na história e, para a população em geral, mais vale ter um
dia sem exigências trabalhistas, que tipicamente se degenera em razões para o
ócio. O calendário cristão, em grande parte marcado por festividades católicas,
é um exemplo típico de perda de propósito. Todavia, a questão se torna mais
sensível por ocasião da Páscoa e do Natal, ambas épocas em que supostamente
eventos espirituais estariam em pauta (mesmo que sem motivo bíblico para tais
celebrações, sendo a primeiro abolida no Novo Testamento e substituída pela
ceia do Senhor, enquanto a segunda jamais fora ordenada pelas Escrituras!): o
que se vê são símbolos duvidosos – o coelho e o Papai Noel –, embalados pela
cultura de consumo. Se são festas da fé, não seria injustos aclarar que tal fé
seja tudo, menos a fé cristã!
O
ano passa mais rápido, não por altercação do tempo: ele se liquefaz, porque a
própria vida na pós-modernidade é líquida, como os sentimentos e compromissos
que voam mais rápido do que as folhas do calendário. Para aqueles que servem a
Cristo segundo a Sua Palavra, vale lembrar da reflexão suprema feita pelo
próprio Mestre acerca das prioridades da vida (Mt 6:25-34) – sem dúvida, algo a
ser considerado em todo o tempo, esteja o ano no seu fim, começo ou em qualquer
outra época. Um discurso cujo essência não é apenas putativa ou do tipo que tenciona
criar uma relação simbólica que remeta a outra sentido, mas ele próprio gerador
de sentido e vida, porque essa era a intenção de Jesus ao proferi-lo. Quem
diria que frases tão contundentes e apropriadas para esse tempo foram ditas há
milênios? Mais uma demonstração de que, se tudo à volta passa, a Palavra de
Deus dura para sempre (1 Pe 1:24-25).
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