Exercer fé não equivale a deixar o cérebro na
poltrona ao lado. Discordar ainda faz parte do exercício civilizado do diálogo.
Assim, ser um adventista não significa assumir que, por sermos o remanescente
da profecia, estejamos no caminho certo em todos os quesitos.
Basta olhar o povo de Israel para perceber que
o povo de Deus nem sempre é fiel. A paciência divina não os rejeitou, mesmo
quando pediram um rei ou sacrificaram crianças a Moloque. Deus lhes enviava
profetas e os orientava. Líderes espirituais eram suscitados. As repreensões
traduziam o coração de um Deus que desejava a prosperidade de Seu povo. Não era
ao menor erro cometido que decaíam de sua condição especialmente favorável.
É saudável a prática da autocrítica, aquela
que nasce da consciência de não estarmos cumprindo o que Deus pediu com as
todas as vírgulas. Repensar os rumos da igreja de Deus é um passo anterior ao
pedido por Sua misericórdia e o desejo de experimentarmos o reavivamento. A crítica
pela crítica pode se tornar uma motivação doentia e perigosa, fruto de um
desejo carnal de ser superior aos demais. Mas a avaliação sensata é um
reconhecimento de fraquezas individuais e desvios coletivos, que, longe de nos
tornar juízes do próximo, faz enxergar que nós e eles precisamos da Graça
porque somos pecadores.
E que tempo vivemos! Como não temer, quando as
pessoas adotam acriticamente um estilo de adoração que copia, ipsis literis, jargões e fórmulas
musicais de grupos pentecostais? Até o rótulo de um trabalho que serve de
referência para o fenômeno é similar ao de uma recente produção realizada por
gente do quilate de Aline Barros…
Como não temer, quando um conhecido músico de
nosso meio admite, sem pudores, que estranhou ao ver o sucesso de uma de suas
composições, incorporada à mesma coletânea de sucesso (citada no último
parágrafo) – sendo que a composição em questão foi, segundo admite o músico,
feita com intenções meramente comerciais! Veja: a questão não é ser errado o
músico ganhar pelos direitos autorais de sua obra, nada mais justo. Todavia,
quando se faz algo apenas visando lucro, como reles atividade, que se pode
esperar dessa obra no quesito conteúdo espiritual? Há muito o que temer!…
Ninguém com alguma lucidez pode evitar o temor
quando composições contemporâneas, em clara demonstração de pouca criatividade,
têm uma única estrofe seguida do coro, os quais se repetem à exaustão, over again, com uma estrutura melódica
pobre e excesso de acompanhamento percussivo. Pior é saber que a cada sábado
esse estilo ganha espaço entre os adoradores, substituindo os hinos clássicos. Aqui,
outra clarificação: não se mede a qualidade da música sacra por sua idade. Há excelentes
canções contemporâneas que jamais, por sua estrutura, andamento, temática ou
arranjos, teriam sido compostas no passado. O novo é bem-vindo quando se apoia
em princípios, não em modismos.
Como não sentir verdadeira angústia quando outra
nova coletânea dessa natureza é anunciada, um segundo volume, ora vejam, novamente
lançada em DVD e reunindo os melhores grupos e talentos individuais do meio
adventista, garantindo o apoio midiático suficiente para seduzir congregações,
sem muito espaço para reflexões (ou autocríticas, se quisermos retomar o tema
de abertura)?
De fato, não precisamos temer. O assunto da
adoração está nas mãos divinas. E Deus é zeloso por Seu nome. Seu Espírito, por
meio daquilo que foi revelado, esclarecerá poderosamente a todos os que lhe derem
abertura. Se a igreja necessita de uma reforma musical (em tempo em que
cantores cristãos apresentam indie rock
na mídia secular e isso é chamado de testemunho!), o assunto está nas mãos de
Deus. Não é por essas coisas que a igreja de Deus deixará de ser a menina de
Seus olhos.
Obviamente, como ao longo da história bíblica
se percebe, aqueles que se envolvem com práticas erradas correm alto risco
espiritual. Porém, creio que o Senhor alcançará aqueles que estão equivocados e
removerá o erro de seus corações. Afinal, todos precisamos da cura que Ele oferece
livremente. Apenas confiando em Deus, desejosos de experimentar as reformas
necessárias, podemos afirmar: não há o que temer!
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Um comentário:
Texto incrivelmente inteligente. Tenho fé de que não foi Douglas Reis que escreveu isso, mas foi o Espírito Santo. Que Deus tenha misericórdia de Seu povo.
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