Cabelos vermelhos,
desfiados, cortados no estilo moicano. Tatuagens verde-musgo correndo pelos
braços, furiosas. Roupas sujas, esfarrapadas. O homem encosta o cavanhaque
espesso no microfone e brada para a sua igreja, como se estivesse em um show de
rock: “Feliz sábado! Sou o Pr. Pedro e assumirei este distrito a partir de
hoje…”
Agora, outra cena: o
tribunal reunido. Réu preocupado, juiz impaciente, promotor triunfante. Falta o
advogado. Eis que, num rompante, chega o defensor. Ele traja uma calça colante
azul, uma camisa rosa e sapatos esverdeados. Boquiabertos, os presentes veem
quando a estranha figura abre a pasta e se posta, esperando o início da sessão.
Agora, o último
exemplo: todos estão em frente a um rio, diante do espetáculo. Ele não é um
saltimbanco, mas consegue atrair boa parte da população. Não com truques de
mágica ou números de malabarismo. Ali está um homem diferente: barbas longas e
roupas de peles de animal, capazes de fazer os ativistas da organização PETA1
ranger os dentes de raiva! Além do visual impressivo, o cidadão tem voz
altissonante e mensagem provocativa.
Por gentileza, pense
por um instante nos três casos acima. Neles, há indivíduos exóticos, pelo menos
à primeira vista. Porém, para além das semelhanças, pode-se notar que nos dois
primeiros casos há uma clara inadequação entre a função e a imagem: ninguém se
sentiria à vontade tendo um pastor grunge ou diante de um advogado que seguisse
a moda “colorido”2. Mas o que dizer do terceiro caso?
Quando leio as
páginas do Novo Testamento, lá está esse terceiro homem. Seu nome? João.
Naquele tempo, João Batista apareceu e começou a
proclamar no deserto da Judéia, dizendo:
– Arrependam-se, pois o reino do céu está próximo.
[…]
João usava roupas feitas de pêlo de camelo e um
cinto de couro amarrado na cintura e se alimentava com gafanhotos e mel
silvestre. (Mt 3:1-2, 4,Versão Fácil de ler).
João Batista é, sem
dúvida, uma figura vistosa. Não é o tipo de sujeito que você esperaria ver na
fila de Banco ou saindo de um restaurante. Qualquer estilista diria que seu
figurino é démodé. Nenhuma
nutricionista aprovaria sua dieta baseada em gafanhotos e mel. Ele tem olhar
penetrante e voz potente. É infatigável e corajoso em suas denúncias. Arauto
incansável, mestre persistente. Vejo-o percorrer distâncias arenosas, fustigado
pelo calor palestino, adornado por expressões de curiosos e sinceros.
Sem dúvida, João não
era seguidor de uma tendência da moda ou fazia parte de uma tribo urbana
(dessas que os pais torcem para os filhos adolescentes não aderirem!). Por
vezes, ele nos lembra os tipos messiânicos dos quais a História testemunha. A
despeito das semelhanças entre o Batista e Antônio Conselheiro ou Inri Cristo3,
há diferenças abissais!
Por mais que João se
pareça com um revolucionário popular ou um religioso charlatão, trajando peles
de animais, a barba a roçar o peito, ele é mais do que aparenta para nós. Examine
o aspecto que o torna inconfundível: a mensagem de João era legítima, ao contrário
da de Conselheiro e Inri. Todo o mais não era questão de excentricidade;
tratava-se de adequação às circunstâncias. Vestir-se daquela forma fazia
sentido em sua época. Se você fosse um judeu do primeiro século e se deparasse
com João, às margens do Jordão, não teria dúvidas: aquele era um profeta, o
porta-voz de Deus!
Analise mais a
fundo, por exemplo, João Batista, que mostrava quem era por sua roupa e
hábitos. O que o motivava? Certamente, sua motivação seguia para além de ter
“um nome a zelar”. João possuía identidade estritamente relacionada com a
urgente missão que Deus lhe dera. Tudo nele contribuía para atingir seu alvo de
vida. Ele não buscava fama ou aprovação social. Não imitava nenhum astro recém-surgido
dos reality-shows. João era autêntico e autenticamente identificado com o que
Deus queria dele. “Por sua vida abstinente e simplicidade de vestuário, devia
[João Batista] constituir uma repreensão para sua época”4, escreveu
Ellen G. White. Neste aspecto, será que estamos à altura de seu ideal de vida?
João Batista era do
tipo que preferia reconhecer a necessidade de um guia no longo deserto da vida.
Já foi dito que a mensagem de João, a qual era “proveniente de Deus [,] não
veio das sinagogas ou das escolas do templo, mas de um homem cuja escolaridade
estava em sua caminhada com Deus.”5 Nas palavras de Ellen White, ele
contemplou “o Rei em Sua beleza, e o próprio eu foi esquecido. Vira a majestade
da santidade, e sentiu-se ineficiente e indigno. Estava disposto a ir como
mensageiro do Céu; não atemorizado pelo humano, pois contemplara o Divino.
Podia pregar ereto e destemido em presença de monarcas, porque se prostrara
diante do Rei dos reis.”6
Será que os crentes
que vivem às vésperas do advento de Jesus estão compenetrados como João em sua
missão de preparar o caminho para o Rei? Será que suas músicas gritam que eles
não pertencem ao mundo que os cerca? Será que suas roupas testemunham que
esperam pelo Rei? Será que seus hábitos contam que eles são hoje “a voz que
clama no deserto”?
Sente você que a
“bendita esperança”, que movia João Batista, comove sua alma e a faz vibrar?
Sinto que enquanto a esperança do retorno do Senhor não nos motivar a falar a
outros sobre o Salvador prestes a vir, permaneceremos por tempo indefinido
neste mundo! Está em nossas mãos apressar o regresso de Cristo.
Referências
1. A organização PETA (sigla de People for the Ethical Treatment of Animals
ou “pessoas pelo tratamento ético aos animais”) milita contra os maus tratos
prolongados sofridos pelos animais nas indústrias farmacêuticas, têxtil,
entretenimento, entre outras. A PETA é bem conhecida por campanhas agressivas,
nas quais recorre frequentemente à nudez. Mais informação se acha disponibilizada no site da
ong: http://www.peta.org/
2. A moda coloridos chegou ao Brasil especialmente
pela banda de Rock Restart. Basicamente, essa tendência explorava cores
vibrantes, chegando até mesmo ao fosforescente.
3. Antônio Conselheiro foi um célebre líder
carismático que liderou a Guerra dos Canudos, no fim do século 19. Ele se
tornou célebre pelo relato de Euclides da cunha, Guerra dos Canudos, clássico da Literatura Brasileira. Inri Christo é um autoproclamado messias
brasileiro, que possui pequeno número de seguidores e que ganhou fama por
aparições bizarras em programas televisivos (sobretudo, os humorísticos).
4. Ellen G. White, O Desejado de todas as nações, p. 69.
5. Myron S. Augsburger;
Lloyd J. Ogilvie, The Preacher's
Commentary Series Matthew
(Nashville, Tennessee: Thomas Nelson Inc, 1982), v. 24, p. 18.
6. Ellen G. White, idem, p. 71-72.
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