sexta-feira, 17 de fevereiro de 2017

O SANTUÁRIO: MENSAGEM PARA ESSE TEMPO


Lentamente, a vida cristã se dilui na cultura. Isso porque o que se entende por vida cristã é a visão evangélica do sacrifício de Cristo/justificação. A teologia evangélica, organizada em torno dessa visão, proporciona uma experiência cristã fragmentada. As doutrinas evangélicas, independente de quais ou quantas sejam, ficam deslocadas nessa estrutura. Isso porque a morte na cruz, nessa versão reduzida ao mínimo possível, se torna um elemento desagregador da doutrina. Não precisamos crer em muitas coisas ou mudar muitas coisas em nossa própria vida quando fomos gratuitamente perdoados de todo pecado.
Como essa compreensão não é bíblica, nem muito menos sólida, ele naturalmente recai para uma versão da graça barata. Não adianta apelar para o papel da obediência na vida cristã sem uma compreensão mais ampla do plano da salvação. Somente a visão bíblica do santuário celestial/santificação proporciona condições para uma vida cristã coerente e transformadora. A salvação deixa de ser veiculada a um evento passado, passando a pertencer à esfera presente. Deus opera no presente na vida do cristão por meio de Sua atuação no santuário celestial. É a contínua intercessão de Cristo (Hb 7:25) que aplica a expiação realizada completamente na cruz. Em outras palavras, o santuário torna efetivo o sacrifício de Cristo na vida do pecador.
Obviamente, as duas etapas do ministério de Cristo só devem ser separadas para fins didáticos. Em realidade, ambas se completam. O exemplo para entender essa intrincada relação é o sistema sacrifical do Antigo Testamento. O sacerdote só pode entrar no santuário com o sangue do sacrifício realizado. Mesmo o sumo-sacerdote entra no compartimento conhecido como lugar-santíssimo no dia da expiação apenas depois de ter realizado um sacrifício. Se o trabalho pelo pecador se resumisse ao sacrifício oferecido, Deus teria pedido a construção de um santuário em vão (Êx 25:8)! Se o sacerdote pudesse entrar no lugar santo sem sangue, a construção do altar e a ordem de sacrificar animais seriam inúteis. Os sacrifícios e a intercessão dos sacerdotes na tenda não eram apenas ações consecutivas como estritamente vinculadas entre si e necessárias para redimir. A morte de Cristo na cruz e Seu ministério sacerdotal no santuário (as duas fases) não podem ser separados – uma parte está vinculada à outra, sendo ambas necessárias para redimir o homem.
Quando essas duas etapas, relacionadas à salvação passada e à salvação presente são devidamente compreendidas, nenhuma área da vida fica fora do evangelho. O plano divino é transformar por completo a existência humana manchada pelo pecado. Para isso, o santuário serve como uma estrada de mão dupla: por meio de Cristo, temos acesso a Deus e, por meio dEle, Deus tem acesso a nós. O direito para ser nosso Intercessor Jesus o conquistou pela cruz. Logo, o santuário não é um meio de diminuir ou desprezar a obra vicária do Salvador na cruz, mas uma forma de exaltá-la e elevá-la à máxima importância.
Como o santuário se relaciona com a diluição da vida cristã? O ministério de Cristo no santuário (obra realizada no presente) corresponde ao processo de santificação (efeito de sua obra por nós no presente). Relacionando a Obra de Cristo com o plano da salvação, podemos entender que a salvação não termina no passado, na cruz. A salvação segue em desenvolvimento, renovando-se a cada dia. A vida cristã torna-se dinâmica e contínua. Aqueles que foram salvos (justificação) por meio da cruz agora se mantém salvos (santificação) por meio do santuário. O ministério de Jesus pelo pecador no santuário celestial impede que a vida cristã seja diluída pela cultura, tradição, inclinações pessoais ou quaisquer outros elementos. Isso não significa perfeição absoluta – algo impossível de se atingir na existência presente. Ao contrário: o cristão terá desafios e quedas, porém seguirá com o alvo adiante de si e as ferramentas necessárias para continuar crescendo na graça de Deus.


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8 comentários:

Unknown disse...

"Não precisamos crer em muitas coisas ou mudar muitas coisas em nossa própria vida quando fomos gratuitamente perdoados de todo pecado.Como essa compreensão não é bíblica, nem muito menos sólida ..." Fico chocado com interpretações que ensinam que não somos gratuitamente perdoados quando a Bíblia afirma isto de forma ampla e muito clara. Realmente é preocupante o nível de fragmentação teológica dentro da IASD.

douglas reis disse...

Aguinaldo,

obrigado por sua interação. Devo ressaltar que o trecho está dentro de um contexto, que reduz a graça de Cristo (a chamada graça barata) a um perdão sem transformação. Isso é resultado de desvincular a justificação da santificação.

Agora, em outros textos já afirmei que todo o processo de justificação/santificação/glorificação é a graça de Deus que produz a salvação no homem.

Agora vincular essa interpretação à fragmentação teológica é tanto forçado como fora de contexto. Acho que você deveria conhecer a teologia da igreja e posso lhe indicar livros que promovem a interpretação que desenvolvo aqui (não criei nada, apenas estou estudando o assunto, na tentativa de entender o que realmente nós adventistas pensávamos sobre salvação no início do movimento).

Abraços.

Aguinaldo Carvalho da Silva disse...

Amigo, conheço bem a teologia adventista. Cresci ouvindo as diversas ênfases que já passaram pela igreja, inclusive a sua. O que se precisa é de raciocínios claros, práticos e objetivos, por isto adotei a visão do relacionamento com Cristo como a base da minha fé. Vc respondeu num outro comentário meu que esta visão é reducionista e incompleta, mas ela é a sintese do processo. Para mim funciona, fiz progressos dentro desta visão. Não adianta fazer enunciados eruditos, de cunho teológico revestidos de alto grau de complexidade mas sem valor prático. No fundo é se vc obedece e se submete a Jesus ou não. Ele está voltando e precisamos falar do jeito que as pessoas entendem.

douglas reis disse...

Aguinaldo,

obrigado pela sua interação.

Devo observar que seu comentário apenas reforça minha impressão. Você desconhece teologia. Desconhece a erudição. Se acha um texto de blog algo erudito, imagine quando ler um trabalho acadêmico de verdade!

Não disse que a ideia do relacionamento com Cristo é errada, apenas incompleta. E isso ouço desde o seminário e endossei isso com poucos exemplos bíblicos. Aliás, se o que eu disse está errado, você deveria contrapor os exemplos bíblicos que mencionei, coisa que negligenciou (ou foi incapaz de) fazer.

Enfim, se vamos usar o que funciona na prática para definir critérios para a vida cristã, somos pragmáticos. Os adventistas usam as Escrituras acima de tudo, inclusive da própria experiência. É a interpretação bíblica a partir da própria Bíblia que estabelece a experiência, não o contrário.

Abraços.

Unknown disse...

Amigo, não é que eu achei seu texto no blog muito erudito, é a falta de aplicação prática que esta ênfase tem. Eu acredito na tipologia do santuário, acho que o ensino do juízo é verdadeiro, mas o que muda a vida e as atitudes é o relacionamento com Cristo. A ênfase evangélica que vc critica é uma necessidade em nosso meio, por isto deve continuar sendo pregada. Vc critica autores adventistas como Morris Venden, com certeza deve criticar Bullon e outros que enfocam a justificação pela fé. Nem preciso contrapor seus argumentos com exemplos bíblicos, pois toda esta ênfase doutrinária é estéril à parte de Cristo. Acho bom vc rever esta postura crítica que acaba sendo negativa para a igreja. Acaso passou pela sua cabeça que a evolução do pensamento adventista em mudar certas ênfases pode ser obra do Espírito Santo, já que Ele está guiando seu povo? Se a coisa está tão perdida assim não faz mais sentido pertencer ao movimento adventista, muito menos como pastor. Estar numa igreja se sentindo dissidente vale mais à pena se unir a um grupo separatista como os Adventistas da Reforma.

douglas reis disse...

Obrigado pela sua interação.

Algumas ponderações:

1) Anteriormente, você havia dito: “Não adianta fazer enunciados eruditos [sic]”. Agora escreveu: “Amigo, não é que eu achei seu texto no blog muito erudito [sic]”. Eu gostaria que você se decidisse sobre como avalia meu texto, ou pensarei que isso constitui fragrante contradição…

2) Afirmar que a posição que defendo não oferece medida prática parece sério. Por que você afirma isso? Será que depender da intercessão de Cristo e da obra do Espírito em conexão com as Escrituras para a santificação não é prático? Nesse caso, de que dependeríamos? Você, que afirma conhecer a teologia adventista, saberia explicar melhor qual a base da santificação? Eu citei alguns versos bíblicos ao longo de minha argumentação. Você em nenhum momento o fez…

3) O movimento Adventista é um movimento de restauração da Verdade. Esse movimento se desenvolve e cresce, aprende coisas novas. Por que um movimento que busca seu referencial nas Escrituras deveria se basear na teologia evangélica, que possui forte influência da tradição? Seria, nesse caso, a influência da teologia evangélica uma “obra do Espírito”? Em que sentido o seria?

4) Dizer que não precisa apresentar versos bíblicos para defender uma posição, isso sim é indício de fragmentação teológica! Você, como adventista, não vê a insegurança de defender uma visão sem a examinar profundamente na Bíblia, apenas baseando-se na experiência humana?

5) Acho que falha em ver que em nenhum momento falei contra a justificação pela fé. Falei contra a visão evangélica que iguala justificação com salvação. Salvação é um processo com três fases. Justificação é a etapa inicial. Alguém que foi salvo passa a viver como um cristão. Viver como um cristão é a etapa seguinte, chamada de santificação. Igualar salvação com justificação é negligenciar a santificação. Simples assim.

5) Eu não disse que “a coisa está tão perdida”. Quem disse foi você. Eu afirmei que há o risco de perdermos nossa essência. Amo minha igreja e fico triste por ver que tantos, dentro da igreja, não entendem o que ela ensina. Mas não sou o único a ver isso não. Leia ¿Adventismo secular? de Fernando Canale. Agora, se você acha tão interessante a ênfase evangélica sobre salvação e não o que os adventistas ensinam em conexão com o santuário, talvez se sentisse mais confortável se tornando um cristão evangélico...

Abraços.

Aguinaldo Carvalho da Silva disse...

Como vc não conseguiu expor a excelência de sua tese então tentou me desqualificar dizendo que eu não entendo nada de teologia. Amigo, os doutores da lei e fariseus também se arrogavam de grande conhecimento teológico, porém foram reprovados por Jesus por errarem em questões como falta de misericórdia. Vc me acusa de ser pragmático, mas só quero destacar que naquele dia Jesus não dirá: "Vinde benditos de meu Pai que se aprofundaram em toda teologia." Ele dirá: "Porque estive com fome e deste-me de comer, estive com sede e deste-me de beber, estive nu e cobriste-me ...." A Biblia fala que: "A religião pura e imaculada para com Deus e Pai, é esta: Visitar os órfãos e as viúvas nas suas tribulações, e guardar-se da corrupção do mundo."Tiago 1.27. Jesus baseou seus ensinos em questões práticas e de fácil entendimento, as parábolas são um bom exemplo disto. A Bíblia é um livro que ensina a religião prática e isto é que conta p/ nossa salvação. Vc que se coloca como um corregedor da teologia adventista e defensor do retorno as bases históricas do movimento, deve perceber que os tempos mudaram e a linguagem e enfoque da mensagem devem passar por adaptações para que consiga atingir as pessoas. Ao meu ver, o enfoque evangélico é esta maneira. Tenho certeza que os pregadores adventistas da atualidade não querem acabar com a crença no Santuário nem revolucionar a doutrina adventista. Me parece que por traz do descontentamento de alguns em tecer críticas e rotular os demais irmãos é mais um espírito faccioso que uma boa inspiração do Céu. Acho que devemos trabalhar pela unidade mesmo que individualmente não percebamos uma uniformidade ideal ou que gostaríamos.

douglas reis disse...

Olá, Aguinaldo.

Percebo uma estratégia em seus comentários, que partem para tergiversação. Você não se dispõe a responder os pontos que lhe pergunto, fugindo pela tangente e sem a capacidade de mencionar a Bíblia, sequer para defender suas crenças ou para apontar meus erros (citou um verso, que não compromete em nada o que defendo, aliás). Assim, o diálogo gira em círculos, com você mudando o assunto sempre que pode, evitando respostas. Isso cansa minha beleza (isso e escrever “traz” como se fosse do verbo trazer).

Encerro nosso diálogo, com algumas breves considerações. Vamos a elas:

1) Não estou expondo uma tese, apenas explorando implicações, ainda de forma bem preliminar. É um blog, não uma revista acadêmica, lembra? Infelizmente, me vejo forçado a repetir isso, pela sua aparente limitação em entender a diferença entre texto acadêmico e texto divulgativo.

2) Pragmatismo x teologia, conhecimento x prática – essa é uma dicotomia pobre. Paupérrima. Pensei estar dialogando em outro nível. Pelo visto…

3) Uma religião prática se fundamenta em uma teologia correta. Jesus condena igualmente os fariseus e fariseus por desconhecerem as Escrituras (Mt 21:42; 22:29; Mc 12:24), o que mostra que era o entendimento errôneo deles que favorecia uma prática errônea. Os espíritas têm uma religião prática, muito bonita em diversos aspectos, o que não significa ser biblicamente correta.

4) Não me coloco como nada, você está me pondo em uma posição que não assumi. Aliás, conforme venho me esforçando para ressaltar, as ideias aqui não são de todo minhas, porque sou devedor a outros pensadores adventistas que, com mais propriedade, têm expressado as mesmas preocupações.

5) A linguagem muda, as estratégias idem, a mensagem nunca! Em outro comentário, você defende uma abordagem a salvação à moda evangélica, como se fosse por condução do Espírito Santo (e reforçou isso agora). Isso é mudança de mensagem, coisa que foge à ideia de um remanescente com uma mensagem distinta, biblicamente estabelecida (embora sempre em progresso). Coisas distintas, meu caro.

6) Não critiquei ninguém, estou discutindo ideias e tendências. É uma discussão sobre interpretação, não sobre as pessoas que a fazem. Não me interessam nomes – citei Desmond Ford como exemplo e marco histórico.

7) Unidade só existe na Verdade, de acordo com Jesus (Jo 17:11, 17, 19, 21). Embora possamos divergir em pontos periféricos, divergir em um assunto tão vital quanto a salvação é preocupante.

Espero que, ao menos, isso sirva de convite para você reexaminar suas crenças à luz da Bíblia.