O pastor Dan Simpson estudou as técnicas de crescimento de igreja propostas por Peter Wagner,
um dos gurus do movimento, e as compartilhou com a congregação adventista que
ele pastoreava, a Calimesa Church.[1] Sem
resultados, Simpson assumiu a congregação adventista Azure Hills, localizada em Grand Terrace, California, no fim do ano
de 1986, onde contou com a assessoria de Carl F. George, um consultor de
igrejas associado ao Charles E. Fuller
Institute of Evangelism and Church Growth.[2]
Em abril de 1989, a associação da qual Simpson fazia
parte votou que ele estabelecesse a congregação que ficaria conhecida como Colton Celebration Center, em um
edifício alugado da denominação Assembleia de Deus.[3] A
proposta logo ganhou adesão de outras congregações adventistas, recebendo
especial destaque as congregações Milwaukie
church, em Oregon e Buffalo church,
em New York.[4]
Nascia o movimento Celebration, que representou
“uma ruptura decisiva com a liturgia adventista tradicional”,[5] o qual atingiu muitas
congregações adventistas nos Estados Unidos durante a década de 1990 e ainda influencia a discussão
sobre liturgia em muitos contextos. O que podemos aprender desse movimento?
Nos bastidores do estilo
celebracionista
Hasel analisando o estilo “celebracionista” de culto, constatou a ocorrência de pelo menos três mudanças: (a) quanto à
estrutura congregacional, sendo que as congregações tornaram-se mais
independentes, abandonando o uso do hinário adventista e agindo
administrativamente como se fossem “mini-denominações”;
(b) quanto à liturgia, que agregou elementos como dança, teatro, inovações
hinódicas, etc.; (c) quanto às doutrinas: ao invés das doutrinas tradicionais
adventistas, a ênfase recaiu sobre amor, perdão e aceitação.[6] A
conclusão de Hasel traz um alerta muito expressivo: “Em nossa fome espiritual,
em nossa ânsia por reavivamento e poder do alto, fixemos nossos olhos na
direção da Palavra de Deus. Na Escritura nós encontraremos força renovada e
poder divino para descobrir e redescobrir a vontade de Deus para Seu povo no
tempo do fim. Os adventistas são o povo do Livro; e o Espírito que fala através
do Livro nos renovará.”[7]
Por que o estilo de adoração celebracionista se oporia
ao estuda das Escrituras? Segundo Bacchiochi deve-se reconhecer que, em muitos
casos, “aqueles que suplicam por música eclesiástica que ofereça satisfação
pessoal ignoram que isso implica buscar uma estimulação física egocêntrica em
vez de um celebração espiritual teocêntrica das atividades criativas e
redentivas da divindade”.[8] Essa aproximação
da cultura secular remete a modelos mais bem observados na fenomenologia de
cultos pagãos. Dorneles afirma que a “relação
direta entre espírito (mundo sagrado) e o homem e a natureza (mundo profano),
quer seja pela gênese dos espíritos como descendentes dos humanos, quer seja
pelo fenômeno de possessão, influencia a aproximação, senão a integração entre
o sagrado e o profano.”[9]
Sem dúvida, isso representa um desvio do propósito da
adoração autêntica, conforme asseverou Ted Wilson, presidente da Associação
Geral da Igreja Adventista do Sétimo Dia: “O diabo está tentando neutralizar a igreja de Deus por
meio da tendência de aceitar a música e adoração carismáticas e pentecostais,
abordagens que focam nos membros da igreja e naqueles que lideram a liturgia,
ao contrário de focar no Deus verdadeiramente adorado. Um falso entendimento da
adoração nos leva ao cerne das três mensagens angélicas, uma vez que tais
mensagens são para que o povo volte à verdadeira adoração a Deus e não à falsa,
experiência eufórica, mas, ao contrário, à genuína conexão espiritual com Deus
por meio do estudo da Bíblia e da oração.”[10]
Como deveríamos celebrar?
Segundo Klingbeil, diante dos riscos da adoração mal
orientada, precisa-se tratar do assunto do culto de um ponto de vista bíblico.[11] Rodríguez
reforça a ideia, enfatizando que “mudanças na liturgia necessitam ser precedidas
de uma análise séria sobre a natureza da adoração cristã que auxiliará no
enriquecimento da experiência de culto dos fiéis.”[12] Os
adventistas do sétimo dia possuem um entendimento bastante claro sobre
adoração. Entretanto, como assinala Fortin, em “anos recentes, uma hermenêutica
pós-moderna de preferências pessoais e culturais tem dominado qualquer
discussão sobre adoração.”[13] O autor segue dizendo que muitos
estudos que pretendem descobrir princípios de adoração são de natureza
revisionista e influenciados pela hermenêutica que ele denuncia. Como
resultado, “todo formato e entendimento sobre adoração são impostos sobre todo
o povo, e que todo estilo de adoração é um objeto de preferências
congregacionais e culturais.”[14] Oliveira advoga uma consciência crítica
fundamentada no significado intrínseco à música: “Se realmente tivéssemos a
devida seriedade e sobriedade que o assunto do uso de música na Igreja requer,
iríamos no mínimo ter a curiosidade de tentar descobrir como a música é capaz
de nos afetar e comunicar ideias e sentimentos.”[15]
Em
qualquer grupo de adoradores, o culto em geral, e o tipo de música em especial,
é conduzido de acordo com a visão que se tem da divindade.[16]
Gordon pondera que por dezenove séculos diversas tradições cristãs, nas mais
variadas culturas, admitiram a convivência de música antiga e contemporânea,
sendo a última selecionada e incorporada no repertório da igreja. A mudança
nesse padrão aponta uma mudança profunda.[17] A
salvaguarda seria propor mudanças no culto somente a partir do entendimento
bíblico, uma vez que, ao introduzir metodologias e práticas sob a influência da
cultura secular, corre-se o risco de comprometer o sistema bíblico-doutrinário
adventista. Conforme Becerra argumenta: “Alguém pode falhar em perceber como a
prática de adoração gradualmente modifica a doutrina. A introdução de práticas
de adoração não enraizadas nas Escrituras poderia ser perigosa. A Igreja
Adventista deveria ser cautelosa em definir teologia e prática de adoração
bíblica. A sociedade contemporânea é caracterizada pelo desejo pela experiência
e sentimentos acima da doutrina, como se vê na adoração carismática
contemporânea. Qualquer adoção de novas formas de adoração deveria ser avaliada
pela sua fidelidade às Escrituras.”[18]
Para Plenc, com base na teologia bíblica, o “culto
deve ser caracterizado pela reverência, ordem e solenidade em equilíbrio com
comunhão, espontaneidade e alegria.”[19] Tanto
na Bíblia quanto nos testemunhos de Ellen G. White, a adoração se fundamenta
“em virtude dos atributos absolutos de Deus, como a infinitude, a eternidade, a
grandeza e perfeição.”[20]
Rodríguez acrescenta que o chamado para a adoração exclusiva que aparece nas
Escrituras ocorre no contexto do grande conflito, sendo a resposta a esse
chamado – e consequente envolvimento na adoração – uma tomada de
posicionamento, traduzida em “expressão de lealdade a Ele [Deus] e um
reconhecimento de Seu amor”, o que tem estreita relação com o coração da
mensagem adventista (Ap 14:6-12).[21]
Conselhos finais
Os adventistas foram agraciados por Deus com orientações adicionais,
provenientes dos testemunhos de Ellen G. White. Nos seus escritos, encontramos
a seguinte repreensão a um grupo de crentes
nos seguintes termos: “Sua
religião parece ser mais da natureza de um estimulante do que uma permanente fé
em Cristo.”[22] Para a pioneira adventista, os "verdadeiros [cristãos] conhecem o valor da obra
interior do Espírito Santo sobre o coração humano. Satisfazem-se com a simplicidade nos
cultos".[23]
Desde o início, o adventismo parece ter lutado contra o excesso de
emocionalismo; por isso, nota-se a recomendação: “A verdade deve ser apresentada à mente o mais isenta possível do elemento emocional”.[24] Por outro lado, não se defende um formalismo mecânico; pelo contrário: “Seu culto deve ser interessante e atraente, não se
permitindo que degenere em formalidade insípida. Devemos dia a dia, hora a
hora, minuto a minuto viver para Cristo; então Ele habitará em nosso coração e,
ao nos reunirmos, seu amor em nós será como uma fonte no deserto, que a todos
refrigera, incutindo nas almas esmorecidas um desejo ardente de sorver da água
da vida.”[25]
E se no passado o movimento celebration
procurou efetuar a evangelização de forma contextualizada à sociedade
norte-americana, é justo que se avalie a iniciativa a partir da contundente
declaração inspirada: “Muitos supõem que, para se aproximar das classes mais
altas, é preciso adotar uma maneira de vida e um método de trabalho que se
harmonizem com seus fastidiosos gostos. Uma aparência de riqueza, custosos
edifícios, caros vestidos, equipamentos e ambiente, conformidade com os
costumes do mundo, o artificial polimento da sociedade da moda, cultura
clássica, as graças da oratória, são considerados essenciais. Isso é um erro. O
caminho dos métodos do mundo não é o caminho de Deus para alcançar as classes
mais elevadas. O que na verdade os tocará é uma apresentação do evangelho de
Cristo feita de modo coerente e isento de egoísmo.”[26]
[1] Viviane Haenni, “The Colton
Celebration Congregation: A Case Study in American Adventist Worship Renewal
1986-1991.” (Tese doutoral: Andrews University,1996), 64.
[2] Ibid., 65.
[3] Ibid., 68.
[4] J. David
Newman e Kenneth R. Wade, “Is It Safe to Celebrate?,” Ministry Magazine,
1990, acesso: 29 de Janeiro de 2017,
https://www.ministrymagazine.org/archive/1990/06/is-it-safe-to-celebrate.
[5] John S. Nixon, “Towards a
Theology of Worship: An Application at the Oakwood College Seventh-Day
Adventist Church.” (Tese doutoral, Andrews University, 2003), 21
[6] Gerard F.
Hasel, “The ‘third Wave’ Roots of Celebrationism,” in Samuel Koranteng-Pipim,
Here We Stand: Evaluating New Trends in the Church (Berrien Springs, MI:
Adventism Affirm, 2005), 395.
[8] Samuele Bacchiocchi, “Una Teología Adventista
de La Música Eclesiástica,” Kerigma (Col. Moderna, México, 2001), no
2, 23.
[9] Vanderlei Dorneles, Cristãos em busca do
êxtase: para compreender a nova liturgia e o papel da música na adoração
contemporânea (Engenheiro Coelho, SP: Unaspress, 2006), 9.
[10] Ted Wilson, “God’s Prophetic Movement,
Message, and Mission and Their Attempted Neutralization by the Devil,” sermão
durante o concílio anual, realizado em Silver Spring em 11 de Outubro de 2014,
accesso 15 de Outubro de 2014,
http://www.adventistreview.org/church-news/%E2%80%98god%E2%80%99s-prophetic-movement,-message,-and-mission-and-their-attempted-neutralization-by-the-devil%E2%80%99.
[11] Gerald A. Klingbeil, “Una Teologia de La
Musica Sacra,” Theologika (Lima, Peru, 1997), ano 12, no 2,
191.
[12] Ángel Manuel Rodriguez (org), Teologia Do
Remanescente: Uma Perspectiva Eclesiológica Adventista (Tatuí, São Paulo:
Casa Publicadora Brasileira, 2012), 18.
[13] Denis Fortin, “Ellen G.
White’ Theology of Worship and Liturgy.” In Ángel Manuel Rodriguez (org), Worship,
Ministry, and the Authority of the Church; Studies in Adventist Ecclesiology -
3. (Silver Spring, MD: Biblical Research Institute, 2016), 84.
[14] Ibid.
[15] Jetro Oliveira, “Além Da Estética: Um Ensaio
Sobe a Música Sacra E Seu Significado,” Kerigma (Engenheiro Coelho, SP,
2006), Ano 2, no 1, 28.
[16] Ver especialmente Wolfgang H. M. Stefani, Música Sacra,
Cultura E Adoração (Engenheiro Coelho, SP: Unaspress, 2002).
[17] T. David Gordon, Why Johnny Can’t Sing
Hymns: How Pop Culture Rewrote the Hymnal (Phillipsburg, N.J.: P & R
Pub., 2010), 42–43.
[18] Sergio E. Becerra, “Worship
and the Magisterial Reformers.” In Ángel Manuel Rodriguez (org), Worship,
Ministry, and the Authority of the Church; Studies in Adventist
Ecclesiology - 3. (Silver Spring, MD: Biblical Research Institute, 2016), 29.
[19] Daniel
Plenc, “Toward an Adventist Theology on Worship,” In Ángel Manuel Rodriguez
(org), Ministry, and the Authority of the Church; Studies in Adventist
Ecclesiology - 3 (Silver Spring, MD: Biblical Research Institute, 2016), 131.
[20] Daniel Plenc, “Elena G. de White Y La
Adoración,” In Hector O. Martín e Daniel A. Mora (ed.), Elena G. de White:
Manteniendo Viva La Visión: Documentos Del I Simpósio Bíblico-Teológico Del
Seminário Teológico Adventista de Venezuela (Yaracuy, Venezuela: Seminário
Teológico Adventista de Venezuela, 2015), 245–246.
[21] Rodriguez, Ángel Manuel.
“Elements of Adventist Worship: Their Theology.” In Worship, Ministry, and
the Authority of the Church, 133–147;
Studies in Adventist Ecclesiology - 3 (Silver Spring, MD: Biblical Research
Institute, 2016), 133.
[23] Ibid.
[24] Ibid., 611.
[25] Ellen G. White, Testumunhos Seletos
(Tatuí, SP: Casa Publicadora Brasileira, 1996), vol. 2, 252.
Nenhum comentário:
Postar um comentário