Enquanto você é conduzido a seu posto, os
gritos, assobios e aplausos desencadeiam a liberação de sua adrenalina. Suas
pernas não ostentam muita firmeza. Mãos e braços parecem tão fora de local que
melhor seria não tê-los. Basta, porém, olhar a figura carismática, trajada com
um terno sofisticado, para que você se acomode no ambiente.
O apresentador desfere um sorriso macio. Você
se contém, o corpo agora empertigado, encarando a plateia. “É melhor sorrir”,
você pensa, “Por que estou diante das Câmeras”. “Bem, vamos à nossa pergunta”,
diz o seu interlocutor com uma ousadia polida.
É hora de se concentrar; o programa oferece um
valor mirabolante, e algo lhe diz que esta é a sua oportunidade. “Muita
atenção: eu vou dar as características de uma pessoa que marcou a História. E
você terá que me dizer sobre quem eu falei. Está preparado? Escute com atenção:
“O seu
pai era um carpinteiro”. Prossegue a voz levemente anasalada. “Essa pessoa não
nasceu como fruto natural do relacionamento de seus pais; Apesar de fazer
sucesso com seus sermões, dizia não desejar o poder do mundo. Ela procurou
instituir a ordem mundial vivendo entre religiosos hipócritas, e se apresentava
como juiz de toda a terra”. “Valendo o grande prêmio da noite, responda agora
quem é esta pessoa?”
O cronômetro passa a regredir. O auditório
suspenso. Você sorri triunfante, certo de que a pergunta está muito fácil.
Nesse ponto, sua mão aperta o botão do painel à frente e você diz convicto
“Jesus Cristo”. O apresentador mantém o suspense e anuncia que a sua resposta
está e… e… errada!!
A personagem é o frade Hildebrando!
NÃO MAIS DO QUE
COINCIDÊNCIAS
Surpreso com o que leu acima? Alguns fatos
sobre a vida do frade Hildebrando: seu pai realmente era um carpinteiro chamado
Banizon. Como ele pôde não ter nascido do relacionamento natural de seus pais?
Em verdade, sua mãe adulterou – os historiadores creem que Hildebrando fosse de
fato filho de seu tio materno, o abade do convento de Nossa Senhora Aventino.
Concluídos os estudos, Hildebrando fez-se
presente na corte do imperador Henrique, o Negro; alcançando grande sucesso com
os seus sermões nesta ocasião, foi designado para realizar uma reforma no
mosteiro de São Paulo, em cuja direção proibiu a presença feminina (razão de
alguns escândalos).
Porém, uma das mais belas serviçais foi
apanhada em constrangedora situação justamente...com Hildebrando!
Acima de tudo, a fantástica biografia de
Hildebrando revela o seu desejo pelo poder, que até mesmo o levou a envenenar
outros oito papas. Chegaria o momento de ver sua empreitada trazer-lhe o êxito:
dado o falecimento do papa Alexandre II, os cardeais reuniram-se na Basílica de
São Pedro, buscando eleger um nome para ocupar o trono pontifício.
Nas ruas, alguns padres se puseram no meio da
multidão passando a gritar por Hildebrando, e o povo não tardou a repetir a
aclamação. Um tal fenômeno de massa levou à eleição de Hildebrando, que sendo
arqui-diácono já atuara como legado papal.
Assumindo a cadeira de São Pedro, o frade
Hildebrando, aliás, agora Gregório VII, aos sessenta anos, trabalhou durante o
seu pontificado (1073-1085) para estabelecer seu domínio temporal. Para ele,
ser representante de Deus sobre a Terra significava governar o mundo. Em
virtude de sua gestão agressiva, a Gregório VII se deve a responsabilidade por
inúmeras guerras e mortes. Um exemplo para o que afirmamos temos na famosa
Querela das Investiduras.
Gregório reclamou exclusivamente para si a
autoridade de nomear bispos, entrando em choque com o imperador germânico
Henrique IV. Os revezes se sucederam de ambos os lados. O monarca chegou mesmo
a ser forçado a viver por certo período uma vida simples, abrindo mão de suas
regalias e posição de comando.
Temendo o pior, o rei não esperou para se
encontrar com o papa no concílio - dirigiu-se à Roma. Após algumas negociações
(envolvendo ouro), Gregório recebe e absolve Henrique, que por três dias em
jejum suportou os rigores do inverno vestido de maneira reles, descalço,
enquanto esperava pela audiência à porta do castelo de Canossa!
Em outra atitude polêmica, durante um concílio,
Hildebrando afirmou preferir padres devassos, sodomitas (homossexuais) e até incestuosos
a aqueles que se casavam!
Creio que já é o momento de pararmos e
refletirmos: um rápido olhar sobre as vidas de Nosso Salvador Jesus Cristo e a
do frade Hildebrando, que assumiu o pontificado como Gregório VII, pode revelar
algumas coincidências. E elas não passam disto: são meras coincidências.
Analisadas ambas as vidas a fundo, encontramos dois homens de princípios
diferentes. Neles, a maior distinção estava na essência da personalidade: o
caráter.
Mas, o que aprofundou o abismo da distância
entre eles?
Muitas seriam as razões apontadas,
principalmente se entendermos a pessoa de Jesus como a Bíblia a apresenta (um
ser divino preexistente e com a mesma natureza que o Pai)! Mas é marcante como
se nota um intransponível contraste desde o tipo de lar que tiveram Nosso
Senhor e aquele religioso com foros de estadista: enquanto Gregório era filho
de uma mulher adúltera, Jesus tinha por mãe uma mulher purificada pela graça de Deus.
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