Quando
ativistas cristãos alertam sobre a secularização de setores da sociedade, a
tendência dos cristãos é se mobilizarem, imaginando ter que fazer alguma coisa
externa, em diferentes níveis: séries evangelísticas visando a alcançar os
"perdidos", seminários para melhor compreensão dos desafios à
mensagem evangélica, eventos de entretenimento "gospel", engajamento
político, etc. Poucos se preocupam em notar os efeitos do fenômeno da
secularização em suas respectivas congregações; entretanto, dificilmente os
crentes poderão causar impacto na sociedade com sua mensagem característica,
caso se encontrem debilitados em razão dos efeitos do que vem acontecendo com a
religião no século 21. Apresentamos três resultantes da secularização e uma
possível resolução para reverter esse processo:
1) A compartimentalização da
experiência religiosa:
Ao ser disseminada a filosofia naturalista e com o advento dos valores da
modernidade, a espiritualidade ficou desvinculada da rotina das pessoas;
assuntos ligados à religião foram relegados a uma esfera à parte.
Com
isso, muitos cristãos vivem semelhantemente às demais pessoas em seu trabalho,
no ambiente acadêmico, na esfera social e até mesmo no seio familiar. O momento
de reflexão religiosa se restringe, muitas vezes, ao ato de assistir ao culto
(um novo paradigma em relação à antiga postura, que exigia a participação no
culto, e não somente como mera reflexão).
A
devoção pessoal, quando tem lugar na vivência, é vista como reflexão desconexa
das decisões diárias no mundo prático, ou seja, trata-se de uma obrigação
religiosa. Simplesmente, a mensagem da fé não possui relevância no mundo real.
2) A espetacularização da experiência
religiosa: Na tentativa de
proporcionar uma renovação da dinâmica do culto, novas alternativas têm
despontado no cenário religioso, entre as quais cultos em que a música
religiosa recebe maior ênfase; vale dizer que essa música possui caráter
próximo das canções populares, além de letras simples, facilmente memorizáveis,
ainda mais se levando em conta o caráter repetitivo das melodias.
Todavia,
para além do aspecto formal das músicas, a própria liturgia dá espaço para a
interação, que ocorre quando o membro realiza coreografias, ou manifestações
corporais espontâneas, como gesticulação, levantar de mãos, bater de palmas,
pulos, gritos intercalados, síncopes, glossolalia (falar sons desconexos),
êxtase místico, etc. Alguns pontos são mais enfatizados do que outros, de acordo
com a orientação denominacional.
A
figura principal nesses cultos costuma ser a do líder religioso, que atinge o
auditório através de uma atuação performática, usando recursos teatrais,
carisma pessoal e se impondo como autoridade religiosa possuidora da unção
divina.
Tudo
isso, fora o caráter numioso frequente em grande parte dos movimentos místicos,
recebe uma "injeção" de modernidade, com inserção de psicologia
popular e promessas de "vitória" no campo material.
3) A automatização da experiência religiosa: O uso extensivo de recursos
tecnológicos, como audiovisual, play-backs
nos momentos musicais e projeção de vídeos durante as preleções, têm um aspecto
dúbio. Por um lado, o emprego de novas tecnologias torna atraente a
apresentação do Evangelho, empregando uma abordagem mais didática e atualizada.
No entanto, não há dúvida de que a participação de indivíduos acaba suprimida
por testemunhos gravados, hinos projetados, videoconferências, entre outros.
Assim, surge uma realidade em que o membro mais assiste do que atua
propriamente no culto (conforme já havíamos mencionado).
A
transmissão de cultos (ao vivo ou editados) por algum tipo de mídia contribui
para que a pessoa se torne um espectador descompromissado, atraído pelo alto
nível da programação, qualidade que se torna um substituto para a frequência
aos cultos, considerados menos atrativos.
Em
grande parte, a secularização consiste em fazer uma releitura crítica do
cristianismo ocidental, banindo elementos religiosos anteriores, embora
tencione conservar os benefícios gerais trazidos pela religião cristã. O
antídoto para isso é caminhar na direção inversa: endossar os aspectos
geradores das estruturas religiosas (e até sociais) através da base bíblica.
Um
efeito colateral inevitável será a reformulação de doutrinas das diversas
tradições cristãs que não coadunam com preceitos bíblicos. Nenhum cristão
deveria se intimidar diante dessa perspectiva, uma vez que determinada
denominação ou tradição teológica não pode suplantar a importância dos
documentos bíblicos quanto à formação de uma visão de mundo.
Outrossim,
as Escrituras forneceram a base para expandir a experiência religiosa,
tornando-a fonte de direcionamento para todas as áreas da vida; também nas
Escrituras a simplicidade do culto, não preocupado com cerimônias ou
sensacionalismo, fornece referência para eventos cúlticos atuais; finalmente, a
teologia bíblica dos dons favorece a participação comunitária, em lugar do
mecanicismo impessoal (o que não significa total descarte do aparato
tecnológico).
Quando
o Cristianismo redescobrir seu livro-texto, a Bíblia, aplicando-a às áreas em
que se mostra deficiente, terá condições de superá-las, vencendo a própria
secularização em seu campo. Expandindo a metáfora (baseada nos campeonatos de
futebol), faltará aos cristãos conquistar outra vitória "fora de
casa" contra o secularismo: a batalha na sociedade pós-moderna.
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