terça-feira, 1 de fevereiro de 2011

O PORQUÊ KAREN ARMSTRONG NÃO CONSEGUE DEFENDER A RELIGIÃO


A revista Veja desta semana (edição 2202, ano 44, no 5) comenta a chegada do livro Em defesa de Deus, da ex-freira Karen Armstrong. A matéria intitula-se O paraíso perdido da fé (p. 106-107) e é assinada por Jerônimo Teixeira. Há mais de um ano, nosso blog comentou a tentativa frustrada (e frustrante) de Armstrong em defender a fé cristã, de uma perspectiva diversa daquela presente no texto da Veja. A chegada da tradução em Português do livro apenas oportuniza que o leitor confira por si próprio a tese da autora.

De minha parte, reitero: a apologia de Armstrong à religiosidade, independente de quanta erudição ela possua (o que chega a ser impressionante), se dá sob falsas premissas. Para ela, a religião não tem de ser verdadeira, autêntica, ao contrário: trata-se somente da expressão inexata de um sentimento relacionado à espiritualidade latente no homem. Parafraseando a autora, Jerônimo Teixeira escreve que a “religião constitui um patrimônio simbólico”, o que não quer dizer que fosse entendido pelos autores bíblicos como algo objetivamente factual. Se for realmente assim, quais seriam as consequências?

Se a fé judaico-cristã se resume à história espiritual de um povo, os neoateus estariam cobertos de razão em descartá-la como fonte de conhecimento real, orientação moral e essencialmente significativa para a experiência humana atemporal. Não nos esqueçamos de que mesmo Dawkins atribui às Escrituras valor estético e literário – embora não duvide de que tudo, no final, se reduza a um mito. Mas, para além das resultantes lógicas do pensamento de Armstrong, como poderíamos analisar seu arrazoado per si? Sustento que a principal falha de Armstrong transpareça na metodologia empregada.

Armstrong adota a base crítico-racionalista, que impõe limitações ao texto bíblico, negando a existência do sobrenatural e envolvendo o processo de composição da Bíblia (que, para os cristãos, é fruto da Revelação) num desenvolvimento histórico totalmente dependente da cultura da época, a ponto de ter seu conteúdo determinado pelos fatores sócio-culturais. Mas, ao contrário do que afirma a estudiosa, descobertas arqueológicas reiteram o que a Bíblia afirmou, em termos de localização de cidades, costumes da época e situações específicas.

Tome-se como exemplo do Êxodo. Os eruditos que estudam o texto bíblico têm-se curvado diante das evidências (e mesmo muitos dos estudiosos liberais). Assim, a data para a composição do livro de Êxodo fica, a contragosto dos teólogos racionalistas, recuada, uma vez que, ao que tudo indica, não poderia ser um relato pseudo-histórico composto no período babilônico (como advogavam aqueles teólogos). Sabe-se que narrador do Êxodo tinha familiaridade com a língua, costumes e geografia do Egito do período posterior à expulsão dos hicsos. Isso quer dizer que o autor bem poderia ser o próprio Moisés, a quem a Ortodoxia atribuíra a escrita do Pentateuco, posição questionada apenas com o advento da Alta-crítica racionalista. E aqui consideramos um de muitos outros exemplos que poderiam ser mencionados.

A fé cristã depende da confiabilidade das assertivas bíblicas. Os melhores estudos vêm confirmando um alto grau de credibilidade histórica destes textos. Em anos recentes, partidários do liberalismo teológico se viram obrigados a rever seus pareceres dogmáticos. Quando Karen Armstrong faz afirmações altamente liberais sobre o texto, passa por cima os estudos mais recentes de crítica textual. Teixeira percebe isso. Ele comenta, ironicamente, sobre as afirmações taxativas da autora sobre datação (recente, segundo os liberais) e mentalidade dos textos bíblicos: “Não fica claro como Karen obteve acesso privilegiado à mente dos redatores do Antigo Testamento” (p. 107).
A tentativa de justificar o Cristianismo protagonizada pela autora de Em defesa de Deus acaba tendo uso contrário do pretenso na mão daqueles que querem atacar à fé.

Felizmente, os argumentos dela são tão irrazoáveis que, se não servem para defender a fé, dada sua inconsistência, se usados para o fim inverso, acabam sendo facilmente rebatidos por quem se encontra bem informado. Acima de tudo, não há indícios de que Deus precise de defensores, ou mesmo de nossa submissão a Seus propósitos – afinal, mesmo “o que de Deus se pode conhecer, […] Deus [nos] manifestou” (Rm 1:19). E a revelação de Deus, embora esteja além de nossa razão, é substancialmente cognoscível e racional. Basta que o homem a investigue com isenção de ânimos.

6 comentários:

Marco disse...

Olá, Douglas.

Relativamente à posição de Karen Armstrong e similares, venho chamando-os há tempos de "O Concílio de Vichy". Neste post, explico por quê:

http://www.criacionismo.com.br/2009/11/o-concilio-de-vichy.html

Um abraço e agradeço pelo livro "Fé Cega" - li-o com o meu filho, que gostou muito.

douglas reis disse...

Marco,

li e achei muito bem pensado o conceito do Concílio de Vichy. Pretendo me referir a ele, atribuindo-lhe os devidos créditos.

Sobre o livro, fico feliz que ele tenha, de alguma forma, ajudado vocês.

Um abraço,

d.

Anônimo disse...

Sabemos que ninguém tropeçará numa montanha. A montanha pelo seu tamanho é vista a olho nu de longe, quanto mais de perto. A montanha indica grau de dificuldade, e todos que dela se aproximam procuram estudá-la para não incorrerem em riscos tentando vencê-la. Já a pedra pequena do caminho..., esta parece inofensiva. Esta qualquer lida. Esta não oferece perigo e, portanto, não se faz necessário temê-la. Pois bem, são exatamente nas pedras pequenas que normalmente tropeçamos. Elas se nos apresenta ingênuas, mas se não tomarmos cuidado, esfóla-nos os dedos, e por vezes, nos fazem até cair.
A ilustração acima indica que precisamos temer as “montanhas” que nos aparecem à frente, mas que também precisamos ser cautelosos com as pequenas pedras que surgem ou que são colocadas no caminho

Que Deus te abençoe cada vez mais, tornando-o o apologista da fé cirstã.

Pr. Gumercindo Castro
PIB em Pavuna - RJ.

magno disse...

Em referencia a ultima parte do texto. Encontrar Deus o homem encontrara. Agora resta saber qual tipo de Deus. Porque ezpinosa entendia Deus de uma forma diferente!

Anônimo disse...

Parei de ler na parte que fala que evidências foram encontradas que sustentam o que está escrito na biblia. A comunidade CIENTÍFICA até hoje não encontrou qualquer evidência CIENTÍFICA dos escritos Bíblicos que tenha considerado fiel aos relatos. Alguns teólogos têm tentado, sem sucesso até o momento, encaixar as peças do quebra cabeças história/ bíblia. A fé deveria ficar apenas no campo da fé, se passar para o campo da razão será uma batalha perdida.

douglas reis disse...

Pois não deveria ter deixado sua falta de informação (ou preconceito) impedi-lo de continuar lendo, uma vez que a Arqueologia, que é uma ciência, já confirmou lugares, pessoas e eventos bíblicos - e isso há mais de um século e meio! Apesar do atraso de sua parte, imagino que sua definição de ciência se restrinja às ciências naturais, o que, além de confusão conceitual, me parece duplamente equivocado, uma vez que entre astrônomos e matemáticos há muitos que escrevem sobre Design Inteligente, corroborando, parcialmente, com a apresentação do relato de Gêneses, base da cosmovisão bíblica. Em suma, quero incentivá-lo a continuar lendo, o que talvez mude suas definições engessadas - espero.