quinta-feira, 10 de setembro de 2009

FAZENDO O MELHOR PELOS OUTROS


De mãos dadas com a sua mulher, o homem negro avança com nobreza até a saída da penitenciária. A imprensa e o povo se espremem na tentativa de vê-lo, acenando entre sorrisos confiantes. Os quase trinta anos de detenção são responsáveis pelas marcas de intrepidez no rosto de alguém que lutou pelo povo – pelo direito de voz e voto, de liberdade e cidadania, de justiça e igualdade para o homem negro. Era o fim do apartheid, regime que segregava desumanamente na África do Sul as pessoas de acordo com suas raças. As pressões internacionais aliadas às revoltas populares consolidavam a libertação de um dos maiores vultos do século XX: Nelson Mandela.

Ao longo da História, apenas poucos homens abraçaram causas humanitárias com tanto destemor e abnegação como Mandela. Isto porque é natural a todos nós buscar aquilo que é de nosso interesse, ao invés da procura por interesses alheios. Por isso, a vida dos herois que lutaram por seus países, povos ou grupos sociais nos emociona tanto!

Semelhante em disposição a Mandela, um estadista hebreu abriu mão de seus interesses, com o objetivo de priorizar o seu povo. Os judeus sofriam em exílio, inseridos em uma realidade mais atroz do que a enfrentada por homens e mulheres negros contemporâneos de Nelson Mandela. Tendo servido na corte desde a época de Nabucodonosor, o profeta Daniel permanecia na política, mesmo após a substituição da dominação babilônica pelo comando do império Medo-Persa. Na ótica do mensageiro de Deus, parecia que o cativeiro era interminável. Embora soubesse, pelo estudo das profecias de Jeremias (Jr. 29:10) que o exílio duraria 70 anos, Daniel sentia-se inseguro, uma vez que nada em seu horizonte apontava para o final do cativeiro.

Uma possibilidade começou a se desenhar na mente daquele estadista hebreu: será que o cativeiro não estava sendo postergado devido aos pecados do povo? Afinal, a própria razão de ser da condição dos judeus, arrastados para um país estrangeiro, tinha explicação na extrema rebeldia nacional, que os levara a rejeitar coletivamente a mensagem divina através de vários profetas, entre os quais contava-se o próprio Jeremias (2 Cr. 36:15-21). Se o comportamento rebelde da nação se repetisse, como Deus poderia abençoá-los?

Como você é capaz de notar, Daniel, a quem a Bíblia não atribui nenhum erro específico e que sempre procurou manter uma conduta exemplar, tinha motivos suficientes para criticar a postura de seus compatriotas. Aliás, não é assim que agimos ao perceber erros na forma como a liderança da igreja atua? Não criticamos os organizadores quanto o culto jovem fica aquém do esperado? Numa geração marcadamente influenciada pelo padrão de qualidade das emissoras de televisão, a exigência é constante. Temos uma percepção mais crítica em relação às atividades da igreja. Mas não para por aí. Tendemos a criticar indivíduos por suas deficiências e fracassos. Esse espírito corrosivo destroi, invariavelmente, volta-se contra nós mesmos, corroendo a espiritualidade – já que a crítica aos que nos rodeiam tira o foco de nós mesmos, deixamos de enxergar a “trave” de nosso olho enquanto reparamos no cisco que invade a retina do próximo (Lc. 6:42)…

Daniel, felizmente, tinha outra mentalidade; ele resolveu orar por seu povo. Não foi uma simples oração antes do almoço – Daniel realmente orou!Ele jejuou e deixou de usar as glamorosas roupas da realeza, passando a se cobrir com um tecido áspero, além de jogar terra sobre a própria cabeça, em sinal de humilhação na presença do Senhor. (Dn. 9:3)

Por favor, não deixe esta cena passar despercebida: Daniel intercede pelo seu povo. Em sua oração, não há discriminação entre ele e Israel como um todo; os pecados são confessados em nome de um “nós”, que engloba indistintamente Daniel e todo o povo. Que auto-conceito equilibrado Daniel manifestou possuir! Longe de qualquer sentimento de prepotência ou arrogância, ele se inclui entre aqueles que necessitam de restauração espiritual (Dn. 9:4-8).

Simultaneamente, o profeta e estadista revela um senso peculiar de dependência divina. Sua confiança na palavra de Deus confiada a Moisés praticamente dirige o raciocínio desta comovente oração (Dn. 9:10-13,SS.)

Não se trata apenas de chifres, animais exóticos, anjos e perseguições; estamos diante do desdobramento do grande conflito. Verdades ignoradas por muito tempo seriam revitalizadas. Um Deus justo acionaria Seu julgamento para condenar o poder romano e reivindicar a causa de Seus seguidores fiéis. Daniel 8 revela a luta entre o bem e o mal. A batalha é muito mais antiga do que muitos podem entender em uma leitura superficial do texto. E o mais importante, dentro dessa batalha, é que você escolha de que lado vai lutar.

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